Saramago, o último grande narrador

Roberto Numeriano1

Numa cultura dominante em que a pulsão da morte constitui a sua essência, o escritor José Saramago, falecido aos 87 anos no dia 18 de junho, foi uma brilhante e genial exceção. Português da aldeia de Azinhaga, filho de pais pobres da região do Ribatejo, Saramago não era homem de concessões hipócritas quanto a princípios morais e políticos nos quais acreditava, e, por isso mesmo, numa época em que tudo está à venda ou pode ser relativizado em nome de projetos pessoais e / ou de grupos, ele se manteve coerente até o fim da vida. Para o bem da alta literatura, dos ideais socialistas e da própria humanidade.

Antigo militante do Partido Comunista Português, Saramago não era “comunista de carteirinha” por acaso. Filiou-se ao PCP em 1969, quando Portugal ainda vivia a ditadura salazarista. O ato foi apenas a formalização de uma militância socialista que vinha de longa data, efeito da sensibilidade moral de um jovem que, tendo nascido no meio de pobres e miseráveis, cedo discerniu as causas da desigualdade social e econômica dos portugueses. Aluno brilhante, teve de abandonar o colégio porque seus pais não podiam pagar seus estudos.

Podia, pela revolta, renegar e esconder sua origem pobre. Podia, como fazem muitos na ascensão social, defender idéias da classe que espoliava os lavradores e proletários do Ribatejo. Podia, por vergonha, fingir que nunca foi pobre. Podia, simplesmente, esquecer. Mas há gente que nasce para lembrar, porque nunca esquece de si mesmo em suas origens. E lembrar por si e pelos outros, pelos que têm boca e língua, mas nunca são escutados; têm olhos e visão, mas são invisíveis em um mundo onde a luz parece se projetar apenas sobre os bens, a riqueza, o luxo, o poder e a ostentação.

Em Saramago, essas dimensões de mestre do romance e de ativista político e social se imbricavam sem que uma tolhesse ou recalcasse a outra. Foram sempre a expressão de uma persona criativa e combativa, rica de uma humanidade onde percebemos a sabedoria dos simples de coração, o humor, a luta dos deserdados, a crítica social e dos (hipócritas) costumes, a denúncia da cegueira de um mundo onde a morte inspira a política do capital, o alerta a respeito da alienação coletiva dos seres humanos, embrutecidos na malha da indústria cultural da incultura.

O poder de sua fábula traduzia justamente este universo, e não por acaso pode explicar o fato de alguns o considerarem “difícil” e ao mesmo tempo ele ser tão lido e admirado por milhões de pessoas, em várias línguas. Em um dos seus raros acertos, o comitê de literatura lhe concedeu o Prêmio Nobel em 1998.

Saramago é, possivelmente, o último grande narrador da humanidade, considerada esta em sua dimensão de um espírito ou idéia universal. Em suas obras, não há como não nos reconhecermos como seres humanos completos, na dor ou na alegria, vivos ou mortos, duvidando dos deuses e das crenças, amando e buscando. Sua morte marca (e aqui a frase feita cabe) o fim de uma época em que a literatura está moribunda e submetida aos escapismos de estilos que apenas revelam sua pobreza. Também simbolicamente, sua morte ocorre em um momento no qual há uma pulsão de morte no movimento de forças econômicas e políticas erguendo-se do espólio neoliberal em vários países europeus, numa onda neofascista que criminaliza migrantes, trabalhadores, etnias não brancas, ativistas políticos e sociais de esquerda, além de estudantes e desempregados.

Contra tudo isso, o grande narrador português nos deixou uma obra para travar um combate que significa a permanência de uma luz que ele fez brilhar nos seus personagens. Em Memorial do Convento, um dos seus grandes romances, os protagonistas Baltasar Sete-Sóis e Blimunda Sete-Luas são a quintessência do amor perene entre um homem e uma mulher, para além do tempo, das fogueiras da Inquisição, da velhice. Quem vê a vida de Saramago, sente que ele tinha o mesmo amor pela humanidade.


1Roberto Numeriano é cientista político (UFPE), professor, jornalista e
candidato do PCB ao Governo do Estado de Pernambuco.

Vitória do operariado friburguense

Depois de quase quinze dias parados, operárias e operários da Fábrica Filó, filial da multinacional Triumph International em Nova Friburgo, terminaram a greve no dia de ontem (09/06), tendo arrancado dos patrões importantes conquistas: reajuste de 16% (dezesseis por cento) nos salários, cesta básica, não desconto dos dias parados e o compromisso assinado de que, caso haja, da parte do Governo do Estado, vontade política para fazer valer o salário mínimo estadual de R$ 603,00, a empresa irá cumpri-lo. O piso salarial da fábrica (que negocia em separado com o Sindicato de Trabalhadores e não participa das negociações em torno do Acordo Coletivo e recusou-se a conceder reajuste no ano passado) ficou em R$ 560,00, um ganho razoável em relação ao piso anterior, de R$ 485,00.

Mais importante do que o ganho material – sem, entretanto, desprezar o significado deste reajuste nas mesas e casas das famílias que dependem dos empregos e salários – é destacar a enorme conquista para a organização e o salto de consciência do grupo de trabalhadores que encarou de forma corajosa as ameaças dos patrões, mantendo a greve até a negociação final satisfatória. A greve representou um marco na história da classe trabalhadora friburguense, que amarga há décadas o refluxo do movimento operário e sindical. As lutas mais significativas dos tempos mais recentes foram a greve dos operários da Fábrica de Rendas Arp (anos 1980), a ocupação da Fábrica metalúrgica Haga (anos 1990) e a também ocupação da Eletromecânica, no início deste século. As duas últimas mobilizações, no entanto, resultaram, depois de arrefecido o movimento, em ascensão de grupos com mentalidade capitalista à frente das empresas ocupadas.

A luta das trabalhadoras e trabalhadores da Filó tem um grande significado neste momento histórico, em que a classe trabalhadora brasileira encontra-se ainda tão dividida por conta dos imperativos do capitalismo contemporâneo e seu processo violento de expropriações (aumento vertiginoso da extração da mais-valia, ampliação da jornada de trabalho, fragmentação das unidades fabris, cooptação ideológica dos trabalhadores para o projeto individualista e consumista, etc). Para as imensas dificuldades de enfrentamento à lógica do capital e aos reflexos da crise econômica mundial, muito contribui a postura de acomodação de setores majoritários do sindicalismo (à frente a CUT e a CTB, que hoje, nacionalmente, pouco diferem da Força Sindical) diante do fenômeno da “globalização” e das ações emblemáticas do governo Lula, que se apresenta como protagonista de um capitalismo “humano”, colaborando, na verdade, para o avanço vertiginoso das relações capitalistas no Brasil e da presença destacada do país no âmbito internacional, como uma nova potência a disputar seu espaço no interior do imperialismo.

Ao longo destes dias de greve, além da comprovada unidade posta em prática pelas operárias e operários da Filó, com a firme condução do Sindicato de Trabalhadores no Vestuário (por sinal, dirigido por companheiros ligados ao PT e à CUT – o que prova a heterogeneidade do movimento político e sindical brasileiro), vale ressaltar também a mobilização dos demais sindicatos de trabalhadores de Friburgo e sua na solidariedade ativa ao movimento: metalúrgicos, têxteis, hoteleiros, professores (das redes pública e particular), trabalhadores da saúde, químicos estiveram na porta de fábrica no dia a dia dos piquetes. Outros sindicalistas colocaram sua estrutura material à disposição da luta. Também os militantes dos partidos de trabalhadores se solidarizaram, como o PT, o PSOL, o PCB e o PSTU, assim como ativistas da Intersindical e da Conlutas.

Avançar na organização da classe trabalhadora friburguense (e de todo o país) continua a ser o grande desafio de todos nós, que desejamos a superação revolucionária do capitalismo. Mas a vitoriosa luta encampada pelo operariado da mais importante fábrica do setor de vestuário de Friburgo (em que pese hoje ocupando posição de menor destaque na economia da cidade, com um número bem reduzido de trabalhadores em relação ao passado) serve de exemplo para os trabalhadores em geral, demonstrando uma vez mais que somente através do enfrentamento ao capital e da organização se obtêm conquistas. Sinaliza também, para setores de vanguarda do movimento sindical brasileiro, que tentam a todo custo a criação açodada e de cima para baixo de uma nova “central sindical”, que a unidade se faz na luta e com a participação efetiva dos trabalhadores e das trabalhadoras.

A luta continua. Avançar na organização da classe trabalhadora para novas conquistas!

Ricardo Costa (Rico) – Secretário de Organização da Base Francisco Bravo (PCB de Nova Friburgo) / Comitê Central do Partido Comunista Brasileiro

Mariátegui e Caio Prado Jr.: Duas visões sobre o socialismo latinoamericano

O Instituto Caio Prado Jr. promove, nesta segunda-feira, dia 14 de junho, às 19 h, um Seminário sobre as contribuições de J. C. Mariátegui e Caio Prado Jr. para o pensamento socialista e comunista na América Latina.

A mesa será formada por RENAN RAFFO, membro do Comitê Central do Partido Comunista Peruano e Presidente do Instituto J. C. Mariátegui (Lima, Peru), MAURO IASI, membro do Comitê Central do Partido Comunista Brasileiro, Diretor do Instituto Caio Prado Júnior e Professor da UFRJ, e LEILA ESCORSSIN, Professora da UFRJ.

O Seminário será realizado na UFRJ, CAMPUS DA PRAIA VERMELHA, no Auditório do CFCH (Anexo, Segundo Andar). A entrada poderá ser feita pela Av. Venceslau Brás (ao lado do Hospital Pinel) ou pela Av. Pasteur (em frente ao Iate Clube).

Trabalhadores da educação protestam contra Governador em Nova Friburgo

Trabalhadores e trabalhadoras da educação pública estadual reuniram-se à frente do Instituto de Educação de Nova Friburgo (IENF) para protestar contra o Governador do Estado Sérgio Cabral – em visita a cidade para inaugurar obras – em virtude das péssimas condições de trabalho, do sucateamento do ensino público e dos baixos salários dos profissionais da rede pública estadual. Também participaram do protesto operárias em greve da Fábrica Filó, cujas máquinas estão paradas desde o dia 28 de maio.

A comitiva do Governador e os ônibus fretados para a inauguração do novo prédio da Coordenadoria Estadual de Educação (localizado nos fundos do IENF) ocuparam toda a rua em frente ao tradicional educandário friburguense, provocando mais engarrafamento no já caótico trânsito de Friburgo, mas a Polícia Militar foi chamada para postar-se, de forma acintosa e ameaçadora, diante da manifestação convocada pelo Sindicato Estadual dos Profissionais da Educação (SEPE). Mesmo assim, utilizando-se de um megafone, pois o uso do carro de som foi proibido pelos policiais, os dirigentes sindicais e lideranças de movimentos populares e partidos de esquerda deram o recado contra a política do Governador de permitir o descalabro nos serviços públicos para justificar a sua privatização e de arrocho dos salários dos trabalhadores. Estavam no ato, além do SEPE, representantes dos sindicatos de Professores da rede privada, Bancários, Hoteleiros e Trabalhadores do Vestuário, Intersindical, CUT, Conlutas, além dos partidos PT, PSTU, PSOL e PCB.


Operárias e operários da Filó continuam em greve

A fábrica Filó (Triumph International) continua com suas máquinas paradas, pois seus trabalhadores aderiram em peso à greve convocada pelo Sindicato dos Trabalhadores no Vestuário, deixando a indústria sem condições de produzir. Os poucos operários fura-greves, que entraram para trabalhar por conta da forte pressão e ameaças feitas pelos patrões praticamente nada têm o que fazer dentro da fábrica, a não ser empacotar as mercadorias que já estavam prontas antes da greve. Além de prejudicar grandemente a fábrica, voltada centralmente à exportação dos produtos de vestuário (lingerie), pequenas confecções localizadas na cidade e nos municípios vizinhos já estão se sentindo prejudicadas, pois dependem de produtos manufaturados pela Filó.

Os patrões, entretanto, recusam-se a oferecer um reajuste de salário digno, que modifique o quadro de superexploração vivido pelas operárias e operários da Filó, que recebem menos que o salário mínimo. Uma comitiva do Sindicato e dos trabalhadores em greve furou o cerco em torno do Governador Sérgio Cabral para exigir o cumprimento da lei estadual (sancionada por ele) que estabelece o salário mínimo em todo o Estado, no valor de R$ 603,00.

Nestes tempos de crise geral do capitalismo, em que patrões e governantes jogam para as costas dos trabalhadores todo o ônus da confusão criada pelo próprio sistema, a greve das operárias e operários da Fábrica Filó e a manifestação convocada pelo Sindicato dos profissionais da Educação do Estado do Rio de Janeiro servem de exemplo para o conjunto da classe trabalhadora de Nova Friburgo de que, mais que nunca, é necessária a luta para resistir à exploração do capital e para avançar nas conquistas!





Todo apoio à greve dos trabalhadores e trabalhadoras da Filó

Operárias e operários da Fábrica Filó (Triumph) de Nova Friburgo cruzaram os braços desde sexta-feira contra a superexploração imposta pela empresa, que já foi uma das grandes representantes das indústrias do vestuário da cidade e hoje, ligada à multinacional Triumph International, paga míseros salários e obriga suas funcionárias e funcionários a cumprir extenuantes jornadas de trabalho, sem a devida remuneração.




Cansados da exploração, trabalhadores da fábrica - na sua grande maioria, mulheres, sob a liderança firme de seu Sindicato, presidido pela companheira Luzia Falcão, decidiram pela greve na última sexta-feira, dia 28 de maio, e continuam parados até hoje, terça, 1º de junho. A greve é a maneira pela qual operárias e operários externam sua indignação pelos indignos salários (a maioria ganha R$ 485,00 brutos, menos que o salário mínimo!!!) e pela recusa da empresa em conceder qualquer reajuste salarial. Os representantes da multinacional no Brasil tiveram a desfaçatez de propor reajuste zero de salário e 2% de participação nos lucros!

A fábrica hoje possui cerca de 700 (setecentos) trabalhadores, os quais aderiram em peso à greve, deixando a indústria sem condições de produzir. Os patrões forçam a barra, telefonando para a casa dos grevistas e exigindo sua volta ao trabalho, mas a peãozada resiste. Os poucos fura-greves e trabalhadores contratados de forma emergencial para substituir os grevistas praticamente nada têm o que fazer dentro da fábrica, a não ser empacotar produtos para a venda, pois as máquinas estão paradas. Um outro fenômeno vem ocorrendo e servindo de estímulo para a continuidade do movimento: muitos dos desempregados convocados a trabalhar na fábrica acabam não aceitando a contratação, quando se deparam com a proposta salarial indecente. Ao saírem da fábrica, são festejados pelos trabalhadores e trabalhadoras em greve.

Militantes do PCB de Nova Friburgo estão prestando solidariedade ativa ao movimento desde a decretação da greve e vêm participando dos piquetes, em conjunto com companheiros dos Sindicatos de Trabalhadores da cidade (Metalúrgicos, Têxteis, Professores, Hoteleiros), do PT e do PSOL. Militante do PT de Nova Friburgo denunciou que o vice-presidente do Diretório Municipal do PT, que fez parte da chapa de oposição à diretoria atual do Sindicato dos Trabalhadores do Vestuário e é trabalhador da fábrica, é um dos fura-greves e faz o jogo do patronato no interior da empresa!!

Até o momento, percebe-se a firme decisão das operárias e operários em seguir com a greve até que a Comissão de Trabalhadores, juntamente com o Sindicato, seja recebida pelos representantes da empresa e possa negociar um reajuste salarial minimamente digno. A luta continua e nossa solidariedade também!!