Muros, mortos e mentiras

Jorge Cadima*

"O adeus ao comunismo? Provocou um milhão de mortos". O título não é de uma publicação comunista. É de um jornal do grande capital italiano, o Corriere della Sera (9.11.09), que noticia um estudo de professores de Oxford e Cambridge, publicado na conceituada revista médica britânica The Lancet. "Baseados nos dados da Unicef, de 1989 a 2002», os autores afirmam que «as políticas de privatização em massa nos países da União Soviética e na Europa de Leste aumentaram a mortalidade em 12,8% […] ou seja, causaram a morte prematura de um milhão de pessoas".

"Morreu-se mais lá onde se adotaram as “terapias de choque": na Rússia, entre 1991 e 1994, a esperança de vida diminuiu em 5 anos». Conclusões de estudos anteriores foram ainda mais graves. Como escreve o Corriere della Sera, «A agência da ONU para o desenvolvimento, a UNDP, em 1999, contabilizou em 10 milhões as pessoas desaparecidas na telúrica mudança de regime, e a própria UNICEF falou em mais de 3 milhões de vítimas». Foi para celebrar estes magníficos resultados que o estado-maior do imperialismo se reuniu em Berlim, com pompa, circunstância e transmissões televisivas infindáveis, numa comemoração do regime em torno dos 20 anos da contrarrevolução no Leste Europeu.

O balanço da restauração do capitalismo é ainda mais grave. Mesmo sem falar no sofrimento dos vivos do Leste – o alastrar de pobreza extrema, dos sem-abrigo, da prostituição, da dependência aos tóxicos ou da emigração em massa para sobreviver – os efeitos das contrarrevoluções de 1989-91 fizeram-se sentir em todo o planeta. As «terapias de choque» de um imperialismo triunfante e ávido por reconquistar as posições perdidas ao longo do Século XX tornaram-se uma mortífera realidade global e tiveram, em 2008, o seu corolário inevitável: a maior crise do capitalismo desde os anos 1930. Uma escalada de mortíferas guerras foram ao mesmo tempo desencadeadas pelo imperialismo, liberto do contrapeso dos países socialistas. Muitas centenas de milhares de mortos (mais de 650 mil só no Iraque, segundo outro estudo publicado em 2006 na Lancet) são o fruto «da queda do Muro» no Golfo, na Iugoslávia, no Afeganistão, no Iraque, no Líbano, na Palestina, e agora no Paquistão – para não falar das agressões "menores".

E foram acompanhadas pelo "Gulag" de prisões secretas dos EUA espalhadas por todo o mundo, no qual desaparecem milhares de pessoas raptadas e torturadas por um sistema de repressão acima de qualquer controlo. Os dirigentes do «mundo livre» que se juntaram, ufanistas, em Berlim, são todos responsáveis por este banho de sangue e repressão. Podem mostrar-se de cara simpática e tratarem-se amigavelmente por Hillary, Angela, Nicolas, Bill, Tony, Obama, etc. Mas das suas mãos escorre o sangue e sofrimento de milhões de pessoas em todo o planeta – de Peshawar a Guantanamo (que continua aberta), de Abu Ghraib às Honduras (que continua sob controle dos golpistas e a indiferença da comunicação social «democrática»), das «maquiladoras» mexicanas aos campos de refugiados palestinos (que continuam – há 60 anos – à espera do seu Estado).

Pelo "Gulag" democrático-ocidental passou Khalid Shaikh Mohammed, que vai agora a julgamento nos EUA, acusado de ser o responsável primeiro do 11 de Setembro (mas não era o Bin Laden?). Segundo o New York Times (15.11.09), "foi submetido 183 vezes à técnica de quase afogamento chamada 'waterboarding'". O jornal afirma que ele também se diz responsável "por uma série de conspirações", como "tentativas de assassinato do Presidente Bill Clinton, do Papa João Paulo II e as bombas de 1993 no World Trade Center".

Mais um afogamento simulado e confessaria também ser responsável pelo aquecimento global e o sumiço de D.Sebastião em Alcácer-Quibir. Mas atente-se na vida do acusado: paquistanês, criado no Kuwait e diplomado por uma universidade americana, viajou, após os estudos, «para o Paquistão e o Afeganistão, a fim de se juntar aos combatentes mujahedines que, nessa altura, recebiam milhões de dólares da CIA para lutar contra as tropas soviéticas» (NYT, 15.11.09). Afeganistão hoje ocupado e onde "segundo responsáveis da OTAN […] um terço dos polícias afegãos são toxicodependentes» (Sunday Times, 8.11.09). Admirável mundo novo que a "queda do Muro" pariu!



* Jorge Cadima é Professor universitário e analista de política internacional

Avante nº 1.877 de 19 de Novembro de 2009
http://www.odiario.info/b2lhart_imp.php?p=1380&more=1&c=1

Carta aberta de Cesare Battisti a Lula e ao Povo Brasileiro

14 de Novembro de 2009

Como última sugestão eu recomendo que vocês continuem lutando pelos seus ideais, pelas suas convicções. Vale a pena!
Por Cesare Battisti


“CARTA ABERTA”
AO EXCELENTÍSSIMO SENHOR
LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA
PRESIDENTE DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL
SUPREMO MAGISTRADO DA NAÇÃO BRASILEIRA
AO POVO BRASILEIRO

Trinta anos mudam muitas coisas na vida dos homens, e às vezes fazem uma vida toda”. (O homem em revolta - Albert Camus)

Se olharmos um pouco nosso passado a partir de um ponto de vista histórico, quantos entre nós, podem sinceramente dizer que nunca desejou afirmar a própria humanidade, de desenvolvê-la em todos os seus aspectos em uma ampla liberdade. Poucos. Pouquíssimos são os homens e mulheres de minha geração que não sonharam com um mundo diferente, mais justo.

Entretanto, frequentemente, por pura curiosidade ou circunstâncias, somente alguns decidiram lançar-se na luta, sacrificando a própria vida.

A minha história pessoal é notoriamente bastante conhecida para voltar de novo sobre as relações da escolha que me levou à luta armada. Apenas sei que éramos milhares, e que alguns morreram, outros estão presos, e muito exilados.

Sabíamos que podia acabar assim. Quantos foram os exemplos de revolução que faliram e que a história já nos havia revelado? Ainda assim, recomeçamos, erramos e até perdemos. Não tudo! Os sonhos continuam!

Muitas conquistas sociais que hoje os italianos estão usufruindo foram conquistadas graças ao sangue derramado por esses companheiros da utopia. Eu sou fruto desses anos 70, assim como muitos outros aqui no Brasil, inclusive muitos companheiros que hoje são responsáveis pelos destinos do povo brasileiro. Eu na verdade não perdi nada, porque não lutei por algo que podia levar comigo. Mas agora, detido aqui no Brasil não posso aceitar a humilhação de ser tratado de criminoso comum.

Por isso, frente à surpreendente obstinação de alguns ministros do STF que não querem ver o que era realmente a Itália dos anos 70, que me negam a intenção de meus atos; que fecharam os olhos frente à total falta de provas técnicas de minha culpabilidade referente aos quatro homicídios a mim atribuídos; não reconhecem a revelia do meu julgamento; a prescrição e quem sabem qual outro impedimento à extradição.

Além de tudo, é surpreendente e absurdo, que a Itália tenha me condenado por ativismo político e no Brasil alguns poucos teimam em me extraditar com base em envolvimento em crime comum. É um absurdo, principalmente por ter recebido do Governo Brasileiro a condição de refugiado, decisão à qual serei eternamente grato.

E frente ao fato das enormes dificuldades de ganhar essa batalha contra o poderoso governo italiano, o qual usou de todos os argumentos, ferramentas e armas, não me resta outra alternativa a não ser desde agora entrar em “GREVE DE FOME TOTAL”, com o objetivo de que me sejam concedidos os direitos estabelecidos no estatuto do refugiado e preso político. Espero com isso impedir, num último ato de desespero, esta extradição, que para mim equivale a uma pena de morte.

Sempre lutei pela vida, mas se é para morrer, eu estou pronto, mas, nunca pela mão dos meus carrascos. Aqui neste país, no Brasil, continuarei minha luta até o fim, e, embora cansado, jamais vou desistir de lutar pela verdade. A verdade que alguns insistem em não querer ver, e este é o pior dos cegos, aquele que não quer ver.

Findo esta carta, agradecendo aos companheiros que desde o início da minha luta jamais me abandonaram e da mesma forma agradeço àqueles que chegaram de última hora, mas, que têm a mesma importância daqueles que estão ao meu lado desde o princípio de tudo. A vocês os meus sinceros agradecimentos. E como última sugestão eu recomendo que vocês continuem lutando pelos seus ideais, pelas suas convicções. Vale a pena!

Espero que o legado daqueles que tombaram no front da batalha não fique em vão. Podemos até perder uma batalha, mas tenho convicção de que a vitória nesta guerra está reservada aos que lutam pela generosa causa da justiça e da liberdade

Cesare Battisti

Carta de Sidney Moura sobre Dilma

Colegas,

Inicialmente gostaria de deixar bem claro: eu não votarei na Dilma.

Tenho minhas razões. Estou convencido de que ela e todos os demais candidatos que se apresentam para disputar as eleições em 2010 não terão compromissos com os reais interesses da classe que só tem a força de trabalho para vender.

Não votarei na Dilma. Nem naqueles que, apesar da crise mundial que desmoralizou a eficiência do capitalismo, continuam a afirmar que somente o setor privado é eficiente, apesar de os cartórios de falência demonstrarem o contrário. Os privatistas da coisa pública dizem que o Estado atrapalha. Mas correm para o estaleiro estatal a fim de tapar os rombos dos transatlânticos empresariais e finaceiros sempre que o "eficiente" sistema de mercado entra em crise. Usam o dinheiro público para salvar especuladores. Enquanto isso, a educação e a saúde continuam sendo sucateadas.

Não votarei na Dilma, nem no Serra, nem nos outros que ora se apresentam porque, no fundo, não passam de gerentes ou síndicos do sistema em que todas as necessidades humanas precisam ser transformadas em mercadorias. Não votarei naqueles que serão financiados pelos grandes grupos econômicos, que irão perpetuar relações sociais desiguais embaladas nas políticas públicas interessadas em encabrestar votos com base na institucionalização da pobreza.

Mas, como professor de História, tenho o dever de oferecer outras visões de certos fatos. Como cidadão tenho o direito de dar minha opinião.

A Dilma, em que não votarei, participou da luta armada contra a ditadura. Não foi um bom caminho. Mas, naqueles anos de chumbo da ditadura fascista, muitos jovens românticos foram simpáticos à ideia de que o regime que torturava e matava os opositores em seus úmidos e sombrios porões poderiam ser derrotados daquela forma. Foi uma opção diferente da de certos privatistas que preferiram viver o exílio dourado na Sorbonne.

Às vezes, em tempos difíceis, é preciso fazer opções. Por isso mesmo muitos jovens, como Jean Mollin, participaram da Resistência Francesa contra Hitler durante a Segunda Guerra; como Dinarco Reis, das Brigadas internacionalistas contra Franco, na Guerra Civil Espanhola; como Patrice Lumbumba, Samora Machel, Agostinho Neto e Nelson Mandela nas lutas de libertação dos povos africanos; Angela Davies em defesa dos afrodescendentes norte americanos; Fidel e Che contra o governo mafioso-marionete de Fulgêncio Batista, entre outros.

Não posso colocar a Dilma, em quem não votarei, no mesmo nível dos acima citados. Mas a atitude dela, no contexto histórico da sua opção, apesar do equívoco, no mínimo deve ser respeitada. Digo isso para que, de forma desavisada, não passemos a reproduzir as provocações do senador Agripino Maia (DEMO-RN) que, em CPI do Senado, perguntou se a Dilma tinha o hábito de mentir. Ao que ela respondeu que, sob tortura, havia mentido para não entregar seus companheiros. E concluiu, ao final, lembrando que, naquela época, o referido senador estava ao lado do regime que fazia calar sob choques e pau-de-arara os que lhes faziam oposição. Será que o príncipe, doutor da Sorbonne, teria a mesma atitude?...Hum... provavelmente não.

Tem uma coisa que é pouco dita. Existiram grupos que entenderam que a única possibilidade de derrotar a ditadura era mobilizando a opinião pública a partir da construção de uma Frente Democrática. Entre estes que optaram pela via pacífica de enfrentamento ao regime ditatorial, muitos também sofreram nos porões da "redentora". Alguns, até hoje, não tiveram seus corpos devolvidos às suas famílias. A tentativa frustrada das bombas do Riocentro estava endereçada a eles.

A vida é dura.

Eu não votarei na Dilma. Ela perdeu a capacidade de seguir chutando, de outras maneiras, as portas das senzalas modernas. Ela, entre outros que se apresentam para o pleito de 2010, estarão a serviço da sobrevida de um sistema de exploração do homem pelo homem. Eu, que sou pelas diferenças e contra as desigualdades, estou à procura de alguém que esteja disposto a lutar contra a rapinagem do darwinismo social e contribua para construir uma sociedade justa, fraterna e igualitária. Que ouse lutar.

Ousar lutar, ousar vencer.

Fraterno abraço.

Sidney
Professor de História da Rede Pública Estadual

Todo apoio ao jornal Brasil de Fato!

O COLETIVO DO CONSELHO EDITORIAL DO JORNAL BRASIL DE FATO, que ajuda a construir essa experiência de imprensa popular, alternativa e autônoma, está pedindo seu empenho, para contribuir e potencializar a construção de uma comunicação contra-hegêmonica da classe trabalhadora.

A experiência do Brasil de Fato já dura seis anos. Nesse tempo, mantivemos viva a ideia de um jornal impresso, semanal, destinado à militância, que circulou regularmente todas as semanas, apesar de todas as dificuldades. Construímos uma Agência de Notícias de rádio, que produz informativos e programas e os distribui para mais de 300 rádios comunitárias, públicas e comerciais. Construímos edições especiais, temáticas, com encomendas de movimentos sociais ou campanhas. Nessas edições, as tiragens têm variado de 200 mil até um milhão de exemplares. As ultimas edições especiais foram sobre agroecologia, sobre o Nordeste e, proximamente, vamos editar um jornal especial sobre as consequências sociais dos projetos financiados pelo BNDES.

Temos uma página de noticias na internet, que tem acessos diários próximos a dez mil consultas. E temos um boletim semanal, que resume as principais matérias e noticias do jornal impresso enviado para mais de cem mil destinatários. Articulamo- nos e fazemos intercâmbio com diversos outros instrumentos de imprensa popular que estão sendo construídos no país, como a revista Caros Amigos, as agências Adital e Agência Petroleira de Notícias, do Sindicato dos Petroleiros do Rio de Janeiro, assim como com as páginas da internet o Vermelho, Correio do Brasil, etc.

Mas tudo isso é ainda muito pouco, perante a hegemonia que as elites brasileiras têm sobre os meios de comunicação de massa no Brasil. Por isso é muito importante sua contribuição militante, para ajudar a fazer assinaturas do jornal impresso, que dão direito a receber o boletim eletrônico e as notícias da Radioagência.

Contribua para manter a imprensa popular e militante. Sem um verdadeiro mutirão de todos e todas é impossível resistir. Aproveite as festas de final de ano para estimular um presente inteligente e duradouro para todo ano.


Coletivo do Brasil de Fato no Rio

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Por trás do Brasil de Fato estão os assinantes,
E dos assinantes, o trabalho de cada militante!

Tristeza, indignação e sei lá mais o quê

Por Luiz Rodolfo Viveiros de Castro

É com muita tristeza, mas tanta, tanta, que suplanta a indignação, que quase me paralisa - e para tentar não ficar parado tento escrever para vocês.

Acabei de entrar agora no globo.com, pensando em ver os resultados do futebol. Já sabia que meu time tinha perdido para o Barueri e que o Flamengo tinha ganho do Náutico; queria saber como foi para o Flu e para os adversários diretos na luta contra o rebaixamento do meu Botafogo. Mas que futebol, que nada. O que importa estar na primeira ou na segunda divisão?

Antes de ir para a parte de esportes me deparei com uma chamada para a matéria sobre o encontro do Lula com o líder da oposição na Itália, o representante da esquerda (?) moderna (?), Massimo D'Alema, que pediu pela extradição do Cesare Battisti.

Não quero nem comentar a matéria toda, dá nojo. Mas aí vai somente um trecho: Lula, ao saber que Battisti estava fazendo greve de fome, brincou: "Eu diria a ele para não fazer greve de fome, eu já fiz e é ruim".

Não sei o que fazer, não sei o que propor, mas quero pedir pra todos - sobretudo para os que estivemos presos - temos que fazer alguma coisa.

Battisti teve a mesma militância que nós, na mesma época. Vivemos num mundo em que o Régis Debray - que caiu na guerrilha do Che na Bolívia - foi ministro da Cultura na França, em que o Franklin Martins, o nosso Franklin, participou do sequestro do embaixador norteamericano: se não contam as motivações políticas, sequestro seria crime hediondo, Não é? Pois é, querem - o governo fascista da Itália - pegar o Battisti como bode expiatório.

Acho que todos conhecem o caso e o processo, mas nunca é demais lembrar que ele foi julgado à revelia, defendido por um advogado a quem nunca deu procuração para tal (e que ficou comprovada a falsificação de sua assinatura na constituição deste rábula) e as únicas "provas" são as acusações de um ex-militante que aceitou a delação premiada, provavelmente até pensando, naquela época, que pelo fato de Battisti estar fora do país podia jogar a culpa nele.

O ministro relator do caso disse que o Brasil devia extraditá-lo mas sem aceitar a prisão perpétua que não existe aqui; temos que exigir da Itália que a pena seja reduzida para 30 anos. Ora, o Battisti tem 65 anos, qual é a diferença? Vai sair com 95?

Sei lá, só sei que se não fizermos nada, nem que seja chorarmos juntos, seremos cúmplices diretos. Pois neste caso a injustiça, no meio de tantas, a perda de uma vida, no meio de tantas perdas, está ocorrendo pertíssimo de nós, com um dos nossos.

Em tempo: os suicídios recentes de presos políticos nos cárceres italianos, acho que foram 14 nos últimos tempos.

Despeço-me dizendo que concordo com a declaração de Battisti - que o Lula deve ou deveria ter lido, sobre a greve de fome - dizendo que prefere morrer fazendo greve de fome do que nas mãos de seus algozes italianos fascistas.

Saudações tristes, revoltadas e sei lá mais o quê!

Comentários acerca do discurso do Ministro das Relações Exteriores de Cuba, Bruno Rodríguez Parrilla, na Assembleia Geral da ONU

A transcrição do discurso chega oportunamente.
(O discurso em questão aparece no final do texto)

Há mais de um mês, os principais meios de comunicação do Brasil escolheram suas manchetes: a recusa do governo cubano em liberar visto/autorização para o lançamento do livro “De Cuba com Carinho”, de Yoani Sánchez, jovem escritora, autora do blog Generacion Y.. A editora Contexto, detentora dos direitos do livro para o Brasil, realizou, dia 29 de outubro, o evento de lançamento sem a autora; prato cheio para uma enorme reação dos principais jornais do Brasil. Só para citar, a questão Yoani foi capa do Prova & Verso d’O Globo (versão on line e impressa), matéria da revista Veja e da Época, do blog de Reinaldo Azevedo..., ou seja, todo tipo de material que se deve ter dois pés e duas mãos atrás antes de ler e pensar em acreditar.

A discussão sobre Cuba e o regime lá instalado é sempre muito acalorado. Já escrevi alguns pequenos artigos falando sobre o país e tentando desmistificar o que nos chega como “informação oficial” ou “verdade inconveniente”. Acontece que até mesmo os maiores detratores da ilha têm que se calar quanto os índices de alfabetização, mortalidade infantil, saneamento básico, entre outros, vêm à tona. Yoani, em sua entrevista à Veja faz questão de dizer que a Cuba de Batista já era um países com as menores taxas de analfabetos do mundo; o que Fidel fez foi dar continuidade ao processo. Desse Fidel continuidade a todo o processo iniciado por Batista e Cuba hoje seria uma Guantánamo dez vezes maior, miserável e cercada por cassinos e prostíbulos por todos os lados.

O que fere Yoani é a falta de “liberdade”. Não pode receber prêmios no exterior cuja maioria é ofertada pelos Estados Unidos. Mas será que Yoani não tem conhecimento do discurso do Ministro cubano em questão? É o próprio bloqueio estadunidense que impede a integração comercial de Cuba com outros países, questões que vão muito além de uma conexão banca larga - que também são impedidas pelo bloqueio..

Conheço algumas pessoas que já visitaram Cuba e já li vários relatos de quem lá já esteve. Todas as opiniões, sem exceção, apontam os pontos positivos da Revolução. Longe de serem demagogos, essas pessoas não escondem que há problemas no país, mas problemas que existem em qualquer outra nação que vive sem um monstruoso bloqueio há muito tempo.

Permitam-me citar alguns trechos do texto de Joaquim São Pedro, jornalista, cujo título é “Não vi a Cuba de Yoani” (disponível em: http://congressoemfoco.ig.com.br/noticia.asp?cod_canal=4&cod_publicacao=30083), mais uma dessas pessoas que quiseram ver Cuba com seus próprios olhos e não pelas páginas de revistas semanais não comprometidas com verdades:

"A revolução assegurou aos cubanos valores que se tornaram inalienáveis. Falo de solidariedade, do respeito à diversidade, do espírito de coletividade, da ética, do amor ao próximo. De direitos como saúde pública, educação, emprego, saneamento básico, moradia e autonomia para o governo gerir as suas riquezas naturais, sem ter de entregá-las ao estrangeiro.”

“A "liberdade" que os cubanos buscam não é uma passagem aérea na mão, mas o direito de continuar a ser uma Nação capaz de enfrentar suas questões internas e externas, sem unilateralidade, promovendo uma política externa de respeito mútuo e às normas internacionais.”

“O socialismo não é o problema de Cuba, é a solução, porque representa a conquista de uma respeitabilidade internacional para o país e seu povo. O obstáculo a ser vencido é a opressão externa, liderada pelos EUA, e a propaganda dos contra que tentam macular a imagem de um governo que expulsou milionários americanos que viviam na ilha em absoluto comportamento predatório.”

"O cubano não esconde mendigos para o turista passar, até porque lá eles não existem. As dificuldades são um problema que todos enfrentam juntos. Não há fome, sede, frio ou pessoas morando na rua. Para enfrentar as catástrofes naturais, como tufões e maremotos, eles desenvolveram técnicas de preservação, antes de tudo, da vida humana, embora haja sérios prejuízos materiais, como o ocorrido no ano passado.”

Somem aos trechos o discurso do Ministro cubano e sem ortodoxia temos que reconhecer que Cuba está anos-luz à frente de países como o Brasil em questões que realmente importam. É caso bem sucedido.


Fernando
UJC Nova Friburgo

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DISCURSO DO MINISTRO DE RELAÇÕES EXTERIORES DE CUBA, BRUNO RODRÍGUEZ PARRILLA NA ASSEMBLÉIA GERAL DA ONU, SOBRE O TEMA "NECESSIDADE DE PÔR FIM AO BLOQUEIO ECONÔMICO, COMERCIAL E FINANCEIRO IMPOSTO PELOS ESTADOS UNIDOS CONTRA CUBA
(Nova York, 28 de outubro de 2009) .


Senhor Presidente, senhores Representantes Permanentes e Delegados:

Alexis Garcia Iribar nasceu em Cuba, na província de Guantánamo, com uma doença cardíaca congênita. Já com 6 anos de idade, depois de sucessivos adiamentos e de complicações, teve que ser operado em 9 de março de 2009, com o coração aberto, porque o governo dos Estados Unidos proíbe que as empresas NUMED, AGA e Boston Scientific vender a Cuba os dispositivos Amplatzer e Embolização Coil para o cateterismo pediátrico que substitui a cirurgia. Eu poderia citar outros 12 casos, com idades entre 5 meses e 13 anos, todos tratados com um procedimento semelhante há um ano e meio, e dois deles em 20 de janeiro.

As crianças cubanas que sofrem de leucemia linfoblástica e rejeitam a medicação padrão não podem ser tratadas com o produto norte-americano "Elspar" criado especificamente para os casos de intolerância. Como resultado, sua expectativa de vida é reduzida e aumenta o seu sofrimento. O governo dos E.U.A. proíbe a empresa Merck and Co. fornecimento para Cuba.

Não é possível adquirir um equipamento analisador de genes, essenciais para o estudo da origem do câncer de mama, cólon e próstata, produzido pela Applied Biosystems (ABI).

Lactalis USA, um fornecedor de produtos lácteos, foi multado em 20 mil dólares pelo governo Eestadunidense.

Desde a eleição do presidente Obama, não houve nenhuma alteração na aplicação do bloqueio econômico, comercial e financeiro contra Cuba. Permanece intacto.

O bloqueio continua a ser uma política absurda que provoca escassez e sofrimento. É uma violação massiva, flagrante e sistemática dos direitos humanos. Na Convenção de Genebra de 1948, é definido como um ato de genocídio. É eticamente inaceitável.

O bloqueio é um ato arrogante e ignorante. Recentemente, o governo norte-americano impediu a Orquestra filarmônica de Nova York de se apresentar em Cuba. Artistas cubanos não podem receber remuneração por suas apresentações ao público norte-americano. Como a criação artística pode ser considerada um crime?

A Microsoft bloqueou o acesso ao Windows Live para Cuba, porque, segundo se lê ao abrir a ferramenta, assim é "para os usuários em países sob embargo dos E.U.A.” O mesmo se aplica as páginas da Web "Cisco Systems", "SolidWorks" e "Symantec".

O bloqueio restringe a banda larga e a conectividade em Cuba. Se proíbe nossa conexão aos cabos submarinos de fibra óptica que passam ao longo das nossas costas.

Por que o governo E.U.A. impede o livre fluxo de informações e o acesso às novas tecnologias?

Mas essas proibições, desumanas e inapropriadas nesta época, não se aplicam apenas a Cuba, mas também a todos os países que vocês representam.

Philips Medical descumpriu o fornecimento de peças sobressalentes para equipamentos médicos comprados no valor de $ 72,7 milhões, instalados em Cuba e na Venezuela. Ela também foi multada em duzentos mil dólares. É uma empresa da Holanda a que o governo estadunidense aplica, extraterritorial, o bloqueio.

Hitachi diz que não pode vender a Cuba um microscópio eletrônico de transmissão, que é essencial em estudos de anatomia patológica, e a Toshiba diz o mesmo sobre uma câmara-gama, equipamentos de ressonância magnética e ultra-som de alta precisão. Estas são as empresas no Japão em que os Estados Unidos aplicam o bloqueio.

À Sensient Flavors, do setor de alimentos, o governo E.U.A. exportar para Cuba, mas é uma filial registrada e com sede no Canadá.

A Siemens, empresa alemã, nos recusou a vender um transformador de 125 MVA, segundo eles, porque tem "a obrigação de seguir algumas regras dos Estados Unidos". Sua subsidiária, com sede na Dinamarca, não poderia fornecer equipamentos para uma fábrica de cimento em Cuba sob proibição E.U.A.

Na Austrália e Nova Zelândia Bank Group (ANZ), com sede na Austrália, recebeu uma multa milionária por fazer negócios com Cuba.

Para 1941 os navios atracados em Cuba, entre julho de 2008 e 2009, foram proibidos de entrar em portos norte-americanos por cento e oitenta dias.

No Relatório do Secretário-Geral das Nações Unidas, incluindo o que foi apresentado por Cuba, existem muitos outros exemplos.

Os representantes E.U.A. estão mentindo quando dizem que o bloqueio é uma questão bilateral. A aplicação extraterritorial das leis do bloqueio, como o "Helms-Burton" e "Torricelli" contra os Estados representados aqui, é uma violação grave do direito internacional, à Carta das Nações Unidas, à liberdade de comércio e navegação. No último período, as medidas do bloqueio foram aplicadas contra, pelo menos, 56 países. Assim, cabe à Assembléia Geral lidar com esta questão.

76% dos norte-americanos, de acordo com pesquisas recentes das instituições deste país, se opõe ao embargo. Ignorar a vontade de mudar e manter o bloqueio é antidemocrático.

Em tempos de desemprego e crise econômica, os empresários norte-americanos têm proibido o mercado cubano. Eles são proibidos de investir em Cuba. Companhias do mundo não têm concorrência norte-americana em Cuba, porque o governo E.U.A. proíbe.

O que teria de errado que os norte-americanos tenham acesso a produtos cubanos? A quem iria prejudicar abrir novos postos de trabalho nos portos dos E.U.A. como resultado do desenvolvimento das relações comerciais normais entre os dois países? Porque os norte-americanos não podem ter acesso aos medicamentos cubanos de última geração para o câncer ou diabetes, e as tecnologias para produzi-los, disponível apenas em Cuba? Por que a empresa Bacardi, que pagou o lobby da Lei Helms-Burton, evita a concorrência e força os norte-americanos a comprar mais caro, uma imitação pobre de rum cubano? Por que um charuto deve ser inatingível e exótico neste país?

O presidente dos Estados Unidos pareceu preso ao passado, quando em 11 de setembro prorrogado por mais um ano o bloqueio baseando-se "no interesse nacional dos Estados Unidos" e com base na Lei de Comércio com o Inimigo de 1917, que se aplica apenas em situações de guerra, e vigente unicamente contra Cuba.

Nenhuma pessoa séria pode argumentar que Cuba é uma ameaça à segurança nacional da única superpotência. Toda a nossa força é a do direito, da verdade e da razão. Parar a inclusão espúria de Cuba na lista de suspeitas de Estados patrocinadores do terrorismo, que é o suporte de algumas medidas do bloqueio e conceder a liberdade aos Cinco Heróis antiterroristas presos injustamente nesse país.

Cuba abriu seu espaço aéreo e aeroportos em 11 de setembro de 2001, de modo que qualquer aeronave estadunidense tinha um lugar para pousar, e ofereceu desde plasma e pessoal de saúde, e em seguida antibióticos e equipamentos contra o antraz, e voltou a fazer uma generosa oferta de médicos quando o furacão Katrina atingiu Nova Orleans.

Cuba é o país hospitaleiro que convida os norte-americanos a visitá-la, chama à cooperação intelectual, acadêmica, científica e ao rico debate, chama seus artistas para construir pontes e as empresas norte-americanas ao comércio e ao investimento.

Senhor Presidente:

Nós todos aplaudimos, alguns dias atrás, quando o presidente Obama disse nesta tribuna: "O direito internacional não é uma promessa vazia (...) Nenhum país pode dominar outras nações."

Não é nem pode ser aceitável para a comunidade internacional que aqueles que governam em Washington sentem-se com a autoridade para aplicar medidas econômicas coercitivas e leis extraterritoriais, contra Estados soberanos.

O presidente Obama tem a oportunidade histórica de liderar a mudança na política para Cuba e para a eliminação do bloqueio. Ele ainda tem os poderes de execução que lhe permitem, agora e por si próprio, alterar o pedido do bloqueio mediante "licenças gerais”, isenções ou dispensas, exceções por razões humanitárias ou de interesse nacional, mesmo sem que fossem mudadas as leis que estabelecem proibições.

Quem se opôe, e desafia com razão o egoísmo e a insensibilidade da direita conservadora, como o presidente Obama fez no Congresso, porque "... um homem de Illinois perdeu sua cobertura (seguros) no meio de quimioterapia ... e morreu por causa dela não podia, sem violar a uma ética elemental, impedir que as crianças cubanas que sofrem de câncer ou doença cardíaca, recebam medicamentos e equipamentos médicos.

O bloqueio de Cuba é também, usando as palavras do senador Edward Kennedy sobre a reforma da saúde, "uma questão moral" que põe a prova testes de "caráter" dos Estados Unidos da América.

Senhor Presidente:

É verdade que Cuba adquire grandes volumes de produção agrícola nos Estados Unidos. No entanto, os representantes dos E.U.A. mentem quando dizem que esse país é um parceiro comercial de Cuba e silenciam que essas operações violam as normas do sistema de comércio internacional, com pagamentos em dinheiro e antecipadamente, sem acesso ao crédito privado pela proibição do transporte de cargas em embarcações cubanas, com procedimentos caros e discriminatórios e que enfrentam constantes manobras para apreender a carga. Ele não pode ser chamado de operações de comércio sem a menor reciprocidade para Cuba exportar seus produtos para os Estados Unidos. Um país que bloqueia outro país não pode ser um parceiro de negócios.

É uma vergonha que os representantes do governo dos E.U.A. Mintam ao dizer que este país é o maior doador de ajuda humanitária a Cuba. Os dados utilizados são falsos. Misturam, em números fantasiosos e maliciosos, a quantidade de supostas licenças e operações que não produzem, e que ocorrem com a ajuda de exilados cubanos que vivem aqui, enviadas por seus próprios esforços, de suas famílias. Sucessivas administrações dos E.U.A. têm perseguido e assediado ONGs que enviam ajuda humanitária a Cuba e, como resultado, a metade deles pararam.

Nem mesmo um ano atrás, quando Cuba foi devastada por três furacões que causaram perdas equivalentes a 20% do nosso PIB, a administração Bush respondeu ao nosso pedido para que as empresas dos E.U.A., excepcionalmente, nos vendessem materiais de construção, telhados e empréstimos privados.

Senhor Presidente:

Os delegados dos Estados Unidos, em várias reuniões, indicaram as medidas tomadas pelo seu governo para eliminar as restrições mais brutais que aplicou George W. Bush às viagens dos emigrantes cubanos e o envio de ajuda aos seus familiares, bem como a retomada das conversações bilaterais sobre a migração e a mala direta.

Essas ações são positivas, mas extremamente limitadas e insuficientes. A realidade é que nem mesmo voltou à situação que prevaleceu até o início de 2004, quando a América do Norte permitiu um certo nível de intercâmbio acadêmico, cultural, científico, desportivo com homólogos cubanos, que continuam proibidos.

Algumas propostas vagas na área de telecomunicações são simplesmente inaplicáveis, enquanto não forem eliminadas algumas das restrições em vigor e pôr fim à prática de roubar fundos cubanos das operações no campo, congelados em bancos norte-americanos, na implementação das decisões de juízes venais que violam suas próprias leis.

Ao restaurar o direito dos residentes de origem cubana de viajar para a ilha , resulta ainda mais absurdo a proibição de norte-americanos viajarem a Cuba, o único lugar vetado a eles em todo o planeta. Os cidadãos norte-americanos que pagam impostos não têm a liberdade de viajar à Cuba, apesar da Constituição estadunidense supostamente garanti-lo. Os norte-americanos não têm direito de receber informações em primeira mão sobre Cuba.

TRADUÇÃO: DANIEL OLIVEIRA (PCB/MG)